Casar é Opcional, Proteger é Essencial

Dados do IBGE, e os mais recentes são do Censo 2022, confirmam o que já vínhamos percebendo no cotidiano: o Brasil mudou a forma como constrói suas famílias. Pela primeira vez na história, a maioria das uniões no país é formada sem casamento no civil ou religioso. As uniões consensuais representam 38,9%, superando os casamentos formais.
Essa virada, que poderia ser interpretada como “modernidade”, “liberdade” ou até “economia”, é na verdade algo mais profundo: é o Brasil real buscando caminhos mais simples de viver junto. E não há nada de errado nisso. O casamento deixou de ser obrigação social. Mas há um ponto incômodo, e urgente, nessa conversa: a liberdade de não casar não pode significar vulnerabilidade jurídica.
O verdadeiro problema não é viver junto sem papel; é viver junto sem proteção legal patrimonial.
Vivemos em um país onde casais investem toda uma vida para construir casa, negócios, bens, patrimônio, mas deixam decisões essenciais para “resolver depois”. Esse “depois” costuma chegar de forma abrupta: numa separação, numa briga familiar, numa doença, ou, no cenário mais difícil, na morte.
E quando chega, o Estado não perdoa a falta de formalização: aplica a lei, que nem sempre coincide com a vontade do casal, por isso, se a nova família brasileira deseja ser moderna, precisa também ser previdente.
Existem três instrumentos simples, e muito poderosos, que qualquer casal deveria conhecer, independentemente de estar casado, em união estável, namorando sério, com filhos ou formando famílias reconstituídas: a holding patrimonial, a doação de bens em vida e o testamento.
Vivemos tempos de incerteza econômica, processos judiciais demorados e riscos crescentes no ambiente de negócios. A holding patrimonial existe como ferramenta moderna para proteger o essencial: o patrimônio familiar.
Ao transferir imóveis para uma empresa criada exclusivamente para administrá-los, o casal separa riscos empresariais da vida familiar, evita penhoras indevidas e facilita a sucessão entre gerações. É um “escudo protetor”, usado mundialmente, mas que só agora começa a entrar na cultura brasileira.
E porque o importante é proteger, há também a possibilidade de ser feita doação de bens em vida, que com cláusulas bem redigidas, possibilita proteger filhos e netos de verdadeiras guerras sucessórias.
A cláusula de incomunicabilidade impede que o bem doado entre em eventual partilha de divórcio, a de inalienabilidade impede que o herdeiro venda um imóvel por imaturidade ou pressão, e o usufruto vitalício permite aos pais doar sem deixar de usar o bem.
Em um país onde as famílias se tornam cada vez mais plurais, recombinadas e móveis, essas cláusulas evitam injustiças e preservam a vontade de quem construiu o patrimônio.
E se nenhuma dessas providencias for usada, também é possível fazer o testamento, que é a vontade da pessoa interessada em dar destino aos seus bens, mesmo depois do silêncio final.
Apesar da resistência dos brasileiros em falar sobre o testamento, como se falar de morte atraísse esses acontecimentos, crendices a parte, prestar testamento evita litígios, desentendimentos, brigas violentas e perda total do patrimônio, já que permite organizar, decidir e direcionar a vontade de quem construiu a patrimônio.
Importante esclarecer que a lei garante a reserva de metade dos bens da pessoa para os herdeiros necessários. A outra metade, a parte chamada disponível, é que pode ser usada conforme a vontade da pessoa, que então determina, em testamento, com liberdade, o destino de seus bens.
Sem testamento, quem decide é o Judiciário, e de acordo com a lei. Com testamento, quem decide é a pessoa, dona do patrimônio que construiu ao longo da sua vida.
Vê-se, portanto, que união consensual não é problema, mas a falta de proteção é. É natural que nem todas as famílias queiram formalizar vínculos da mesma maneira, mas ninguém deveria abrir mão da segurança jurídica.
Não importa se a relação é casamento, união estável, família recomposta, homoafetiva, sem filhos, com filhos ou multigeracional, o que importa é que cada casal, formalizado ou não, compreenda algo simples: casar é opcional, proteger a família, o patrimônio e a própria vontade, isso é fundamental.